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Um estilo acima de uma canção

Blues 1Tenho uma relação muito particular com a música. Meus heróis da adolescência invariavelmente empunhavam uma guitarra e entoavam cantos que a mim diziam muito. Projetava neles a minha liberdade e achava que o tipo de música que eu ouvia dizia muito sobre quem eu era ou como eu pensava.

Quando eu próprio ganhei minha primeira guitarra — da qual extraio algumas notas de maneira rudimentar — a música adquiriu outra dimensão. Passei a valorizar o chamado feeling de um músico em detrimento de harmonias complexas ou técnica apurada. Assim, quando um amigo pediu que eu falasse sobre a minha música favorita, tentei identificar no repertório dos meus artistas preferidos uma canção que fosse mais importante do que as outras. Fracassei. Não fui capaz de escolher uma. Senti que seria injusto com as outras. Concluí que não tenho uma música preferida e sim um estilo preferido: o blues.

O blues (falo do autêntico) é uma manifestação artística dos desesperados, oprimidos, desiludidos. Nasceu entre os escravos que utilizavam a melodia para relatar a sua angústia, o seu lamento diante das mazelas da vida. Por isso, as interpretações de artistas como Buddy Guy, Etta James ou Muddy Waters são tão arrebatadoras. Impossível ficar indiferente diante de um clássico do Mississipi (mesmo que tenha sido produzido e gravado em Chicago ou outra praça).

Sinto uma mudança instantânea no meu estado de espírito quando ouço um blues. É como se a mão divina me suspendesse e me transportasse para outra dimensão a cada mudança de compasso. É delicioso sentir-se seguindo o músico para ver onde as blue notes nos levarão. Se for pra citar uma música para esse momento, sugiro Feels Like Rain, clássico do Buddy Guy.

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Texto criado à partir de uma provocação do amigo e escritor Valmor Bordin que quis saber “qual a tua música preferida?”

Siegel-Schwall

TheSiegel-Schwall Siegel-Schwall Band é uma banda de branquelos de Chicago formada em 1964 e gravou uma série de albuns entre 66 e 74, a maioria pelo selo Vanguard.

Corky Siegel (harmônica) e Jim Schwall (guitarra) conheceram-se quando eram alunos do curso de música na Universidade de Roosevelt. Siegel era um saxofonista que tinha no blues a sua principal influência enquanto que Schall era apreciador da música country americana. Mas o gênero que prevaleceu nesta fusão foi o blues, embora o country esteja presente nas guitarras executadas por Schwall.

Durante muito tempo eles foram a banda residente em um clube chamado Pepper’s Lounge em Chicago e acompanharam em algumas ocasioões músicos do nipe de  Junior Wells, Buddy Guy, Billy Boy Arnold, Little Walter, Muddy Waters, entre outros,

A banda acabou em 74 após lançar o premonitório R.I.P. Siegel/Schwall. Reuniram-se novamente em 87 e fizeram algumas sessões esporádicas desde então.

No lynk à seguir um grande momento dos caras em 1971, antecipando o que Brian Setzer viria a fazer alguns anos depois com sua Big Band. http://www.youtube.com/watch?v=d8QRr92qDWc

E em uma aparição recente executando “I Think it was wine” http://www.youtube.com/watch?v=_kAwum6NuTI

Sangue Azul

Muitos são os postulantes. Alguns até carregam o título no nome. Não tenho dúvidas, todos são nobres e dignos de admiração: BB King, Freddie King, Albert King e outros mais humildes.

Existem discussões intermináveis em torno do tema. Cada um tem sua legião de seguidores e não há consenso entre os súditos, pois todos têm aura, luz, energia, postura de majestade.

Diferentemente do futebol, do Rock, do Reggae, e até da música brasileira, onde todos sabem quem é o Rei, no blues o trono parece estar vago. A plebe não se atreve a fazer sua escolha e a nobreza, por respeito e índole parece não achar necessário reconhecer um que se distinga dos demais.

É interessante que no Rock houve uma disputa declarada pelo cetro. Jerry Lee Lewis, Little Richard e Chuck Berry, reivindicaram a coroa (e Jerry Lee se acha merecedor até hoje), mas, embora não haja unanimidade, todos reconhecem Elvis como o Rei. Quanto a Pelé, Bob Marley e Roberto Carlos, não há discussão.

Mas e no blues; quem é o Rei? Quem está no topo? Eu já tenho o meu eleito: trata-se de Mr Buddy Guy. Suas interpretações comoventes (onde até a desafinada característica de sua voz provoca sensações incomparáveis) são a pura honestidade. E o vigor de sua pegada blueseira nos transporta a lugares onde não se chega sozinho. Um simples bend do Buddy tem mais feeling que horas e horas de muitos guitarristas consagrados. É como um flecha certeira no coração.

Tive a benção de vê-lo duas vezes em Porto Alegre e acho que ele está até um pouco acima disso, pois naquela noite no teatro do Sesi estivemos todos perto do céu.